Dois homens estranhos entre si firmam um pacto violento, que implicará em morte e sofrimento. Parece a trama de Pacto Sinistro, dirigido pelo mestre do suspense, Alfred Hitchcock, e baseado no primeiro romance policial de Patricia Highsmith. Porém, esse acordo sombrio guarda semelhanças assustadoras com a vida real.
Existe um pacto sinistro e silencioso já consolidado entre nós, os homens, na sociedade em que vivemos que pouco ou nada queremos falar sobre.
O Pacto e quando ele começa
Desde a infância, nós, homens, somos ensinados a repelir tudo o que faz parte do universo feminino. Conforme os anos passam e nos tornamos adultos, essa pressão só aumenta. A mídia e a cumplicidade de outros homens são fatores que apoiam e reforçam ainda mais essa espécie de “acordo coletivo” masculino. Além do medo de qualquer identificação com o gênero feminino, a sociedade espera que os homens atendam a uma expectativa impossível de ser alcançada, baseada na homofobia e no sexismo.
Essa mentalidade representa o que há alguns anos foi batizada de “masculinidade tóxica” (que ganhou a grande mídia há mais ou menos cinco anos) que é aprendida e ensinada de geração em geração e padroniza o que é esperado como comportamento masculino. Algumas exigências são: ser fisicamente forte, ser o provedor da família, jamais demonstrar fraqueza, ser sexualmente ativo e impositivo, apresentar comportamentos homofóbicos, reprimir suas emoções e os seus próprios sentimentos, não levar desaforo para casa e ser violento.
Esse modo de pensar assina esse pacto masculino em favor do silêncio e da violência para que os homens sejam aceitos como homens "de verdade" gerando problemas sociais graves, como a propagação de relacionamentos abusivos, a desigualdade no mercado de trabalho e a violência sistemática de mulheres e de pessoas LGBTQIAPN+.
O que muitas pessoas não imaginam é que essa masculinidade hegemônica (termo correto, ao invés de “tóxica”), prejudica os homens tanto quanto as mulheres.
Quais são os efeitos nocivos da masculinidade hegemônica para os homens?
A sociedade patriarcal em que vivemos determina como deve ser a identidade masculina e aprisiona os homens em uma imagem de força e poder onde não existe espaço para emoções. Esse modelo deturpado constrói a cultura em que vivemos por meio das músicas, das roupas, da linguagem etc; e impõe um pacto silencioso, onde não é aceitável demonstrar vulnerabilidades, fragilidades ou dividir problemas pessoais, como a depressão, entre outras doenças mentais, afinal, tudo isso seria sinais de fraqueza.
Segundo a pesquisa “O Silencio dos homens”, realizada em 2019 pelo Instituto PdH + Zooma Inc, 6 em cada 10 homens afirmam possuir distúrbios emocionais de algum tipo, como ansiedade, depressão, insônia e vício em pornografia. Muitos não são diagnosticados pois evitam buscar ajuda. E apenas 3 em cada 10 homens possuem o hábito de conversar sobre os seus maiores medos e dúvidas com seus amigos. O simples fato de poder pedir ajuda sem ser ridicularizado ou escutar piadas pejorativas e preconceituosas poderia ajudar a salvar muitas vidas.
Mas, infelizmente, não é o que acontece. Os homens se suicidam quatro vezes mais do que as mulheres e 83% das vítimas de mortes por homicídios e acidentes são homens. Além disso, os homens representam 95% da população carcerária no Brasil.
Ou seja, os homens estão matando mais e morrendo mais.
Esses dados apenas escancaram a urgência de buscarmos uma masculinidade plural excluindo a ideia de que nós, homens, não podemos expressar nossas próprias emoções e falar sobre nossa saúde mental, pois isso seria supostamente uma identificação com outro gênero. Não falamos porque somos ensinados assim (afinal, ouvimos desde muito cedo: "engole o choro, moleque!", "fale igual homem" e "largue de frescura"). E esse silêncio nocivo causa destruição e nossa própria aniquilação.
Saúde mental é um assunto de extrema importância que deve ser debatido com muita seriedade e não menosprezado ou encoberto por estereótipos criados por uma sociedade preconceituosa, homofóbica e machista. Não podemos nos calar, precisamos exercer nosso direito humano e genuíno de nos expressar saudavelmente! É nosso dever quebrar esse silêncio mortal selado por esse tratado insensato. A verdadeira força dos homens está na coragem de falar sobre nossas fragilidades, enfrentar nossas doenças físicas e mentais e quebrar o padrão falido imposto pelo patriarcado.
O primeiro passo para sair dessa prisão solitária e quebrar esse círculo de violência que atinge todos os gêneros é tomar consciência desse problema estrutural e não tentar negá-lo. Sua existência é irrefutável e seus efeitos avassaladores. Precisamos refletir, conversar e debater sobre ele para juntos agirmos contra esse padrão de masculinidade que nos intoxica e nos mata. Lutemos a favor da liberdade de cada indivíduo ser homem como sente que deve ser.
Um outro passo importantíssimo é o combate à violência que nós homens promovemos às mulheres e a outras identidades de gênero. Especialmente as mulheres que morrem por serem mulheres, vítimas desse sistema que as coloca em um lugar de não existência. Precisamos unir nossas forças para, enquanto olhamos e trabalhamos nas nossas questões masculinas, trabalhamos no sentido de responsabilizar e conscientizar outros homens para eliminarmos esse mal do sistema patriarcal que é o machismo.
Nós homens precisamos reconhecer que somos parte do problema. Ao mesmo tempo fazer algo, sair da inércia, pois a solução passa por nossas próprias ações. A verdadeira liberdade não pode existir quando estamos aprisionados em estereótipos, preconceitos e medos, muito menos quando estamos ligados a um acordo tóxico. Vamos deixar de lado esse Pacto Sinistro e todos os seus prejuízos para a ficção e que a singularidade de cada pessoa seja respeitada e aplaudida.
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